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Brasileiros desenvolvem tratamento para câncer

A ciência brasileira deu um grande passo à frente na busca pela cura do câncer. A farmacêutica Carla Holandino, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), vem desenvolvendo em laboratório uma terapia que tem se mostrado eficaz contra tumores cancerígenos, a eletroterapia tumoral (ETT). De baixo custo e isento de efeitos colaterais significativos, a ETT tem tido sucesso nos testes in vitro. A pesquisadora agora está aprimorando a técnica, associando-a à nanotecnologia, o que pode potencializar em muito o tratamento.

– Os efeitos testados em animais têm sido surpreendentes – afirma Carla.

Com apoio da Faperj, por meio do programa Jovem Cientista do Nosso Estado, o projeto, intitulado “Novas estratégias terapêuticas para o tratamento de tumores: O uso de correntes elétricas contínuas de baixa intensidade”, já tem pedido de patente.

– A eletroterapia tumoral é um tratamento relativamente antigo, que consiste em aplicar correntes elétricas de baixa intensidade diretamente em tumores cancerosos. Foi desenvolvida em 1980 pelo pneumologista sueco Bjorn Nordstrom, que iniciou seus estudos mostrando os efeitos de campos elétricos em tumores de pulmão. A China foi o primeiro país a aderir à prática – conta Carla.

De lá para cá, a eletroterapia tumoral vem se desenvolvendo bastante, principalmente em países com tradição de usar medicina complementar – expressão que a pesquisadora prefere à medicina alternativa -, como Cuba, Chile e Argentina. No Brasil, começou a ser desenvolvida há pouco tempo.

– Quase não temos bibliografia de autores brasileiros sobre o assunto. O que temos hoje é fruto do trabalho de uns poucos pesquisadores que se interessaram pelo assunto. Além de nossa equipe, há no país dois outros grupos, representados pelo físico Marcos Telló, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS) e pelo médico Orlando Parise, especialista em cirurgias de cabeça e pescoço, de São Paulo. Nos encontramos por meio de um artigo em revista e temos trabalhado em conjunto para tornar o tratamento ainda mais eficaz – relata a pesquisadora.

Em seus estudos, Carla procurou analisar, em laboratório, o mecanismo que está por trás do funcionamento da eletroterapia.

– Comprovamos que a ETT é capaz de destruir as células tumorais por meio de dois mecanismos distintos. Em um dispositivo de três partes, criado pelo fisioterapeuta e mestre em biofísica Venicio Féo da Veiga, pudemos simular, separadamente, o mecanismo da eletroterapia sobre células cancerosas. Algumas foram atingidas pelo polo positivo, outras pelo polo negativo e as que ficaram no meio não receberam estímulos de nenhum dos dois polos – explicou a pesquisadora.

Com o experimento, comprovou-se que o eletrodo positivo induz à apoptose da célula, enquanto o negativo, à necrose. Pelos dois processos, a célula morre.

– Entretanto, o primeiro é mais eficiente, pois, com a necrose, a célula pode se desfazer e espalhar seu conteúdo contaminado para o organismo – compara.

Ela fala ainda que as células que ficaram na parte central do equipamento tiveram crescimento interrompido.

– Isso comprova a eficácia da ETT e põe fim ao empirismo do tratamento, já que o método foi testado em laboratório – fala.

Num segundo momento, Carla passou a estudar porque o estímulo elétrico do polo positivo estimula a apoptose das células tumorais.

– Percebemos que é gerado na célula um agente lesivo, espécie oxidante chamada cloramina, que estimula o suicídio celular. Mimetizamos, então, a substância em laboratório e constatamos que, ao adicioná-la às células tumorais, a apoptose acontecia de forma ainda mais rápida – explica a pesquisadora.

A partir dessa comprovação, surgiu a ideia de associar a nanotecnologia ao experimento.

– É uma inovação tecnológica inédita e já patenteada. Criamos um polímero minúsculo que, quando preenchido por aminoácidos e associado ao estímulo elétrico produziria cloramina, e poderia destruir o tumor mais rapidamente. Além disso, evitamos o aumento de necroses, pois,com este artifício, podemos usar uma voltagem muito mais baixa. Desenvolvemos uma formulação em gel com esses componentes – complementa.

Em conjunto com Marcos Telló, Carla passou à fase de experimentos com animais.

– Foi impressionante. Um de nossos primeiros testes foi realizado com três animais: duas cadelas com câncer de mama e um rato com um melanoma na nuca, enorme e projetado para fora. O rato, em estado terminal, já não conseguia respirar direito. Passamos o gel no local, aplicamos a ETT e coletamos material para biópsia, imediatamente após a aplicação da ETT e, depois, de 15 em 15 dias. Um mês mais tarde, o animal estava praticamente curado, com energia até para brincar, sem tumor aparente. Em todos os três não havia a presença de células tumorais identificadas por análises citopatológicas. Nenhum deles apresentou qualquer efeito colateral com o tratamento. Isso nos deixou ainda mais animados a levar os estudos adiante – conta a pesquisadora.

Tudo isso tem despertado o interesse de outros países na conjunção de forças com os pesquisadores brasileiros.

– No ano passado, num congresso no Centro Nacional de Eletromagnetismo Aplicado (CNEA), em Cuba, vimos que, naquele país, já se tratam pacientes com eletroterapia há cerca de 10 anos. Depois da minha apresentação, um dos professores do centro, Hector Camué, mostrou interesse em trabalhar conosco e promover intercâmbio entre os nossos alunos e os de lá – conta.

Como resultado, foi firmado um termo de colaboração, do qual, além de Brasil e Cuba, também participam Argentina, México e Peru.

– Minha preocupação é trocar não apenas conhecimentos com Cuba, mas também recursos humanos. A participação de todos é fundamental para levarmos tudo isso adiante – diz a pesquisadora.

Para a efetiva aplicação do tratamento de pacientes no Brasil, ainda são necessárias mais algumas comprovações científicas. Para isso, aluno de mestrado de nosso grupo, o farmacêutico Cesar Augusto, está desenvolvendo um projeto sobre o uso da ETT no câncer de pulmão.

– Conseguimos a colaboração do pneumologista Marcos Pascoal, do hospital universitário da UFRJ, que já está pensando em equipamentos específicos que permitam o acesso a tumores brônquios e pulmonares de forma não invasiva.

A equipe ainda precisa verificar como age cada tipo de célula tumoral em testes in vitro para depois fazer os testes em animais e, numa terceira etapa, ter a aprovação dos comitês de ética para os testes do tratamento com pacientes. Para cada tipo específico de câncer, o procedimento precisa ser repetido.

– Com a união de conhecimentos com outros grupos de pesquisa, temos conseguido avançar em nossas pesquisas. Espero, que em breve, possa ser adotada pelo Sistema Único de Saúde (SUS) esta terapia complementar contra o câncer – finaliza Carla.
 
 

 

Fonte: Por Ascom da Faperj